A sofisticação chegou de vez ao campo — e com ela, uma explosão de cores, sabores e aromas que cabem na palma da mão. À frente da Calusne Farms, em Campinas (SP), o produtor Sérgio Ricardo Donófrio cultiva, com um misto de precisão e sensibilidade, verdadeiras joias comestíveis: minilegumes, brotos, alfaces gourmet, flores e ervas aromáticas que abastecem desde chefs estrelados a buffets exigentes.
Tudo cultivado com olhar artesanal, inovação e, claro, muita paciência com o clima e a escassez de mão de obra.
“A gente não está falando só de comida. Estamos falando de experiência, estética e exclusividade”, diz Donófrio, ao comentar o foco da fazenda em nichos altamente valorizados pela gastronomia contemporânea.
Entre os carros-chefes estão as alfaces do tipo Friilice e Friseé, conhecidas por formar buquês cenográficos em pratos sofisticados. Crocantes, coloridas e delicadas, elas são cultivadas em uma área de cerca de 100 mil m² que mescla cultivo ao ar livre e em estufas — dependendo da sensibilidade da cultura.


verdadeiras joias comestíveis
Calusne Farms e os novos objetivos
A Calusne Farms também aposta em uma linha de flores comestíveis, que deixou de ser um capricho gourmet e virou tendência até mesmo entre os clientes mais tradicionais. “Hoje vemos flores em buffets, sobremesas, pratos do dia a dia. Elas perderam aquele ar de exclusividade de restaurante francês e ganharam novos espaços”, destaca. O problema? O calor extremo.
Donófrio explica que as ondas de calor dos últimos anos têm dizimado várias espécies mais delicadas, mesmo com estufas e sombreamento. “Estamos testando irrigação com microaspersores, que reduzem os danos nas pétalas e ajudam na floração, mas é uma luta constante.”
As estrelas da vez
A linha de brotos — como beterraba, rabanete, nabo e repolho roxo — também chama a atenção. Cultivados com sementes sem tratamento químico, os brotos são colhidos entre sete e 10 dias após o plantio, higienizados e vendidos em porções de 50 gramas, suficientes para embelezar até 30 pratos. E o detalhe que faz toda a diferença: sem defensivos químicos. “O apelo da pureza e da estética vende muito”, afirma.
Já os mini legumes parecem saídos de uma feira futurista: mini cenouras, mini milhos, mini abobrinhas, mini berinjelas, mini alhos-porós… Tudo com tamanho reduzido, mas sabor e textura em alta.
Complementam o portfólio uma seleção robusta de ervas aromáticas, das clássicas às exóticas — incluindo manjericão tailandês e o pouco conhecido manjericão canela.
Beleza que não passa despercebida
Mesmo que não sejam incorporadas ao prato principal, as flores comestíveis adicionam um toque especial à apresentação dos alimentos — e esse visual tem conquistado cada vez mais espaço, inclusive na confeitaria.
Sérgio Donófrio destaca que o boom do empreendedorismo durante a pandemia impulsionou a procura por flores para decoração de bolos e biscoitos artesanais. “Muita gente começou um negócio de confeitaria nesse período e continuou depois do fim das restrições. Esse público mantém a demanda aquecida até hoje”, explica.
Na prática, as flores comestíveis se tornaram um dos carros-chefes da fazenda. Não é exagero dizer que a estética virou um diferencial competitivo — e, em muitos casos, o que encanta os olhos é o que vende. “Elas têm se destacado bastante nas vendas. E o interessante é ver como saíram da alta gastronomia para conquistar também o dia a dia de quem quer um prato mais bonito ou um evento mais especial”, diz Donófrio.
Apesar do sucesso, os desafios são pesados — e implacáveis. “O clima é algo que a gente não controla”, desabafa. Ondas de calor extremo, chuvas fora de hora e mudanças abruptas de temperatura são inimigos constantes, especialmente das flores mais delicadas.
A solução? Criar microclimas artificiais com sombreamento, telados e estufas. Mas nem sempre funciona. “Muitas vezes é insuficiente. Quando vem aquele calorão ou uma chuvarada forte, não há muito o que fazer.”
Calusne Farms aposta em tecnologia que protege e prolonga a vida das flores
Na linha de frente contra as pragas, Sérgio aposta em tecnologia — e de preferência, com o menor impacto ambiental possível. “Estamos usando defensivos mais modernos, muitos deles orgânicos, com carência quase zero, principalmente nas flores. Isso é essencial porque o cliente final está cada vez mais exigente quanto à segurança alimentar.”
Já nos minilegumes, o cenário é mais tranquilo: “Eles crescem debaixo da terra, como cenouras e beterrabas, e não exigem muitos defensivos. A exceção é a miniabobrinha, que colhemos rapidamente para evitar ataques.”
A tecnologia também aparece no pós-colheita. Sérgio utiliza ozônio para a higienização das verduras — uma alternativa ao cloro, mais eficiente e segura para o consumidor. E nas embalagens, nada de plástico comum. As flores são armazenadas em recipientes que não embaçam, mantendo o visual impecável. “É essencial para quem quer escolher pela cor. Além disso, essa embalagem ajuda a conservar melhor as flores no estoque dos clientes.”
Redes sociais e o novo apetite por beleza
Segundo Donófrio, as redes sociais também vêm impulsionando o consumo, principalmente entre novos públicos. A estética do alimento — especialmente com flores e hortaliças delicadas — virou um diferencial que atrai restaurantes, confeiteiros e até consumidores domésticos. “Um prato bonito gera curtida, gera compartilhamento e, muitas vezes, gera venda. Isso tem ajudado muito a expandir o mercado, inclusive para os minilegumes e os brotos.”
Na região de Campinas, o Instagram virou praticamente uma vitrine a céu aberto para a Calusne Farms. “Atendo muitos clientes físicos que chegam até nós depois de verem nossos produtos nas redes sociais”, conta Sérgio Donófrio.
Restaurantes, influenciadores de gastronomia e até empórios que compartilham fotos de minilegumes e flores comestíveis ajudaram a criar uma corrente de visibilidade — e, com isso, os produtos gourmet começaram a chegar também à mesa do consumidor final. “As pessoas passaram a pedir para uso em casa. Não é só restaurante ou bufê — o público doméstico entrou com força.”
Esse movimento, que já vinha engatinhando antes, disparou depois da pandemia. O delivery passou a fazer parte da rotina da fazenda e, para surpresa de Sérgio, muitos clientes daquela época continuam até hoje. “Tem gente que faz pedido semanal. E não é só alface, não — é flor, broto, minilegume. O paladar se sofisticou, e isso tem ajudado muito nas vendas.”
Inovação como rotina: sementes, testes e exclusividade
Pensando no futuro, a Calusne Farms está longe de acomodar-se no sucesso atual. A inovação é praticamente uma regra do jogo. “A gente está sempre buscando variedades diferentes e produtos exclusivos. Temos parceria com empresas como TopSeed e Isla, e colaboramos no lançamento de novas sementes — seja em cores, formatos ou sabores.”
Esse trabalho conjunto coloca a fazenda na linha de frente do desenvolvimento agrícola. “Antes mesmo de o produto ir para o mercado, testamos em campo e damos nosso feedback. Isso nos dá uma certa vantagem, porque conseguimos oferecer essas novidades primeiro.” E isso, claro, atrai olhares exigentes — especialmente de chefs que trabalham com gastronomia de alto padrão. Casamentos, eventos corporativos, menus sazonais… todos querem um ingrediente que ninguém mais tem.


Gourmet de verdade: proximidade, frescor e agilidade
Dos cerca de 100 mil metros quadrados de área plantada na Calusne Farms, mais de 60% está dedicado exclusivamente a produtos gourmet: flores comestíveis, brotos, minilegumes e ervas aromáticas.
E o segredo da qualidade está na geografia. “Como tudo isso é produzido aqui mesmo, conseguimos colher e entregar no mesmo dia. Frescor total.”
Para produtos mais resistentes, como algumas alfaces, a fazenda trabalha com parceiros em outras regiões — mas mesmo nesses casos, a logística é ágil, com entregas em 24 horas. “O que realmente diferencia nosso trabalho são os itens gourmet, que saem direto do campo para a mesa, com visual impecável e qualidade premium.”
Donófrio resume a essência do negócio em poucas palavras: plantar com excelência, colher com agilidade e entregar com exclusividade. Num mercado em que estética, sabor e frescor andam de mãos dadas, a Calusne Farms prova que não basta ser do agro — é preciso ser do futuro.
Vamos ao que interessa
A aposta nas hortaliças gourmet tem uma lógica clara: é um mercado que paga por exclusividade, mas que também cobra eficiência cirúrgica. “Esses produtos são mais delicados e exigem muito trabalho manual. Não dá pra mecanizar o cultivo como nas hortaliças convencionais”, explica Sérgio Donófrio. O resultado? Um custo de produção mais alto e produtividade mais baixa — uma equação que exige planejamento fino para fechar no azul.
Peguemos como exemplo a minicenoura ou o minimilho. Para gerar um volume razoável em quilos, a área plantada precisa ser considerável. Mas o desafio vai além da quantidade: manter o padrão visual — que é o que encanta o cliente — é uma batalha diária. “Cada cenoura é semeada individualmente. Algumas crescem fininhas, outras engrossam demais. Na hora da colheita, só as que estão no ponto ideal são selecionadas, uma a uma. É um trabalho minucioso.”
A comparação com as hortaliças tradicionais deixa clara a disparidade na rentabilidade por volume. “Enquanto uma berinjela comum pesa meio quilo, precisamos de mais de cem minimilhos para fazer um quilo. E isso, claro, impacta diretamente no custo-benefício.” É aí que entra a matemática delicada da precificação: se o preço vai alto demais, espanta o consumidor comum e limita o mercado à alta gastronomia; se o preço é baixo, a operação não se paga.
E qual é a saída para esse dilema? Diversificação. A Calusne Farms não aposta todas as fichas em um único produto, mas sim em cinco linhas simultâneas: alfaces, brotos, flores, temperos e legumes.
Isso permite montar pedidos mais completos, otimizando a logística e diluindo os custos. “Quando um cliente compra de tudo um pouco, conseguimos entregar com eficiência, manter um preço justo e garantir que a operação como um todo seja viável. Mesmo que a margem em cada item gourmet seja apertada, o conjunto fecha bem.”
Essa estratégia tem sido o motor de sustentação da fazenda — e é o que permite à empresa atender desde restaurantes estrelados até consumidores domésticos exigentes, sem abrir mão da qualidade e do frescor que definem o DNA da marca.
“Trabalhar com gourmet é como fazer alta costura: dá trabalho, tem mais desperdício, mas o resultado final é uma peça única. E quem entende, paga por isso.”
Os obstáculos da Calusne Farms
Mas, nem tudo é perfumado como alecrim. A Calusne também enfrenta os desafios clássicos do setor: produtividade aquém do desejado, dificuldades climáticas e o fantasma da mão de obra rural. “É cada vez mais difícil encontrar quem queira trabalhar no campo, principalmente aqui na região de Campinas, onde há muitas opções mais atrativas do que ficar debaixo do sol”, desabafa. Temos funcionários conosco há mais de 20 anos, mas encontrar novos trabalhadores que fiquem mais de um ano é um desafio. Investimos na formação deles e, quando saem, temos que começar tudo de novo.”
Para driblar isso, a Calusne Farms tem recrutado colaboradores do nordeste, principalmente de Alagoas, por meio de indicações internas. “É onde temos conseguido mais estabilidade.”
Mesmo com essas adversidades, Donófrio mantém firme a aposta na verticalização e no controle de todo o processo produtivo, da escolha das sementes à entrega final. “Produzimos todas as mudas internamente porque precisamos de variedade, padrão e confiabilidade. Comprar muda pronta não garante isso.”
E é justamente essa obsessão pelo controle e pela qualidade que transforma cada folha, flor ou broto da Calusne em item de luxo. Afinal, no mundo das hortaliças gourmet, o diferencial não está apenas no sabor, mas no encanto que começa antes mesmo da primeira garfada.
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