

Orlando Gonçalves Brito
Engenheiro agrônomo, doutor em Produção Vegetal, especialista em Produção e Melhoramento de hortaliças e pesquisador – Universidade Federal de Lavras (UFLA)
orlandocefet@yahoo.com.br
A batata-doce é uma das principais culturas alimentares do mundo, destacando-se pelo seu sabor agradável e elevado conteúdo nutricional. Além disso, a planta é de fácil cultivo e adapta-se com facilidade a diversos ambientes, especialmente em regiões tropicais.
De acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), no ano de 2020 a Ásia liderou a produção mundial de batata-doce, com 66% do total. A China, por si só, respondeu por uma produção anual de 53,01 milhões de toneladas, representando mais de 58% da produção global estimada em 91,95 milhões de toneladas.
Após a Ásia, a produção é mais significativa na África, com 28,3%, seguida pelas Américas, com 4,6% da produção mundial.
No Brasil
Apesar da importância da cultura para o Brasil, o país configura-se apenas como o 15º maior produtor mundial de batata-doce. Isto decorre dos baixos níveis tecnológicos aplicados aos cultivos, como preparo inadequado do solo, fertilização inadequada do solo, ausência de irrigação e escassez de genótipos adaptados às diferentes regiões de cultivo, o que resulta em produtividades muito aquém do potencial da cultura.
Mesmo diante deste cenário, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a área de batata-doce cultivada no Brasil aumentou 20,7% entre os anos de 2016 e 2020, saindo de 49.554 ha para 59.790 ha, respectivamente.
Isto elevou a quantidade produzida em 26,7%, com produção de 669.454 t em 2016 e 847.896 t em 2020. Além disso, houve um aumento significativo no valor da produção durante o mesmo período, aumentando em 26,1%, de R$ 801,23 milhões para R$ 1,01 bilhão.
No entanto, o incremento na produtividade durante esse período foi considerado modesto, com apenas 1,3% de aumento, passando de 14,07 toneladas por hectare em 2016 para 14,25 toneladas por hectare em 2020.
Versatilidade
A cultura da batata-doce apresenta ainda uma grande diversidade de usos, sendo mais comum a utilização de suas raízes na alimentação humana. Segundo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a produção de batata-doce no Brasil tem crescido de forma expressiva no país nos últimos anos, especialmente pelas suas características nutricionais, como baixo índice glicêmico, alto conteúdo de fibras e elevado teor de vitaminas e minerais.
Estas características promovem a batata-doce como um alimento saudável e recomendado em dietas mais saudáveis. Contudo, há outros usos emergentes na espécie, como a produção de ramas para alimentação de animais, produção de etanol e uso agroindustrial.
Raízes de polpas coloridas
As raízes tuberosas são o principal produto comercial da cultura da batata-doce, sendo frequentemente preparadas por meio de cozimento, fritura ou assadas. Essas raízes podem conter teores significativos de matéria seca (MS), excedendo 42%, predominantemente composta por amido, com mais de 85% de sua composição.
Além disso, são uma fonte rica em proteínas, fibras alimentares, vitaminas, minerais e compostos bioativos. Esses nutrientes não só fornecem energia, mas também possuem um valor antioxidante elevado, além de propriedades nutracêuticas, anti-hepatotóxicas, anti-hipertensivas, anti-inflamatórias, antibacterianas e anticarcinogênicas. Tais propriedades são fundamentais para a promoção de um estilo de vida saudável.
Com o lançamento de cultivares de polpas coloridas, o acesso a genótipos mais nutritivos foi potencializado. Quanto maior a intensidade na pigmentação das raízes de reserva, ou seja, polpas de coloração intensa alaranjadas, amarelas e roxas, maior a presença de compostos bioativos funcionais, como pró-vitaminas, fenólicos e compostos antioxidantes.
Como exemplo, as raízes de polpa alaranjada, por exemplo, destacam-se pela riqueza em betacaroteno, um pigmento carotenoide precursor da vitamina A. Esse nutriente é essencial para o desenvolvimento adequado dos órgãos visuais, formação da pele, prevenção de doenças e crescimento do corpo.
Já as raízes de polpa roxa são ricas em antocianinas, consideradas potentes antioxidantes e atuam como prebióticos. Essas propriedades conferem benefícios adicionais para a saúde e, em conjunto com os demais nutrientes, tornam a batata-doce um alimento altamente recomendado para uma dieta equilibrada e benéfica ao organismo.
Ainda engatinhando
O mercado de batatas-doces de polpa colorida ainda está em estágio inicial no Brasil. Isso se deve à preferência do consumidor brasileiro por variedades de polpa creme e branca, bem como ao acesso limitado dos produtores a cultivares de polpa colorida de alto rendimento.
Em várias regiões, a menor comercialização dessas variedades de batata-doce está associada à falta de divulgação desse tipo de produto. Portanto, o mercado de cultivares de polpas coloridas é promissor e deve ser incentivado.
Diversas cultivares têm sido desenvolvidas por instituições de pesquisa, como Embrapa, Universidade Federal de Lavras (UFLA), Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri), Instituto Agronômico de Campinas (IAC), dentre outras.
Como genótipos de polpa laranja podemos destacar cultivares ‘BRS Nuti’ e ‘Beauregard’, registradas pela Embrapa e com alto teor de betacaroteno. Já em relação às cultivares de polpa roxa, destacam-se a ‘UFLA R1440’, desenvolvida pela UFLA, além de cultivares desenvolvidas pela Embrapa, como ‘BRS Anembé’ e ‘BRS Cotinga’.
É importante ressaltar que há diversas cultivares e de múltiplas aptidões. Assim, cabe ao produtor verificar as mais recomendas para sua região de cultivo e com maior potencial para a finalidade de interesse.
Reaproveitamento de ramas
Outra oportunidade potencial de mercado reside na utilização das ramas para a alimentação de animais. Ao adotar essa prática, o produtor consegue aproveitar um resíduo com alto valor nutricional que, por vezes, é negligenciado nas propriedades.
Estudos têm revelado que, além de serem ricas em vitaminas e minerais, as ramas de batata-doce possuem aproximadamente 20% de matéria seca (MS) e 11% de proteína bruta (PB).
Levando em consideração que alguns experimentos têm indicado a possibilidade de produzir entre 50 e 70 t ha-1 de ramas frescas, o produtor pode obter entre 10 e 14 t ha-1 de MS e 5,0 a 7,0 t ha-1 de PB apenas com as ramas descartadas na propriedade.
Além de serem altamente nutritivas, as ramas podem ser disponibilizadas aos animais de diferentes formas, como consumo in natura, emurchecidas, na forma de silagem ou feno. A realização da ensilagem é interessante, pois permite enriquecer as ramas com outros resíduos, como fubá, farelo de soja, polpa cítrica, etc.
Isto eleva expressivamente o conteúdo da silagem. Já a fenação favorece principalmente a conservação pós-colheita das ramas, além de aumentar a concentração nutricional destas.
Alternativas
O reaproveitamento das folhas da batata-doce para a produção de saladas também é um mercado promissor. Há décadas atrás, este tipo de consumo era muito comum no Brasil, porém foi se perdendo ao longo do tempo.
Contudo, a prática é muito comum em países asiáticos e africanos. Além de altamente nutritivas, as folhas da cultura, assim como as raízes, também são ricas em compostos nutracêuticos benéficos à saúde, como antocianinas e carotenoides.
Apesar deste potencial, no Brasil não há cultivares desenvolvidas e registradas para esta finalidade. Todavia, a UFLA tem desenvolvido pesquisas com esta finalidade e identificado genótipos promissores para o consumo de folhas.


Estas pesquisas demostraram ser possível produzir de 70 a 120 mil maços de folha por hectare, o que pode representar uma renda significativa nas propriedades.
Desta maneira, fica evidente o potencial da utilização das ramas para uso na alimentação humana e animal, cabendo aos produtores e pesquisadores o desenvolvimento destes novos mercados.
Mercados emergentes e potenciais aplicações
Dentre os novos mercados em expansão para a batata-doce, a indústria de alimentos é o de maior destaque. Isso ocorre pois ainda há uma demanda crescente por produtos industrializados à base de batata-doce.
Estes produtos concentram-se principalmente na produção de doces, purês, snacks, chips, pães, bebidas lácteas, farinhas, fécula, etc. Apesar disso, há uma carência de cultivares de alta produtividade e qualidade de matéria-prima (raízes) para atender a este mercado.
Considerando a grande diversidade de produtos que podem ser desenvolvidos com a cultura, é essencial que o sistema produtivo do agricultor esteja alinhado às demandas da indústria. Isto é importante principalmente na escolha da cultivar a ser produzida, pois cada produto apresenta demandas específicas, como teor de matéria seca e de amido, coloração, etc.
Vale ressaltar que, nos últimos anos, a indústria de alimentos tem investido boa parte de seus recursos no processamento de raízes de polpa colorida, um nicho de mercado com alto potencial de crescimento.
Produção de bioetanol
Assim como a mandioca, o sorgo e a cana-de-açúcar, a batata-doce possui as qualidades necessárias para ser utilizada como matéria-prima na produção de álcool. Não sendo muito exigente quanto à qualidade do solo, pode ser cultivada em terras semiáridas, com adubações reduzidas e de baixo custo.
Uma vantagem competitiva da batata-doce é o seu curto ciclo de produção (4,0 – 6,0 meses), permitindo que sejam conduzidas duas safras por ano. Da mesma forma, um dos pontos fortes dessa cultura é a sua aptidão natural voltada a pequenas e médias propriedades.
Em função de sua rusticidade e das exigências de terras de baixa a média fertilidade e do ciclo curto, essa é uma planta que se enquadra perfeitamente no sistema de agricultura familiar.
Comparada com culturas como arroz, banana, milho e sorgo, a batata-doce é mais eficiente em quantidade de energia líquida produzida por unidade de área e por unidade de tempo. Isso ocorre porque produz grande volume de raízes em um ciclo relativamente curto, a um custo baixo, durante o ano inteiro.
Biocombustíveis
Embora ainda seja pouco usada para produção de etanol, a espécie apresenta grande potencial para produção. Algumas, cultivares de batata-doce, obtidas por meio de melhoramento genético, mostraram índices de produção de etanol por hectare duas vezes maior que os de cana de açúcar.
Resultados de pesquisa têm demostrado a rendimento médio de etanol entre 120 e 180 L t-1 de raízes. Considerando que determinados genótipos produzem até 70 t ha-1 de raízes, há possibilidade de se produzir entre 8,0 a 12 mil litros de etanol em período de seis meses.
Isso demonstra alta competitividade com a cana-de-açúcar, além de apresentar outras vantagens ecológicas e sociais mais sustentáveis.
Indústria de bebidas
Além de ser uma alternativa saborosa para os consumidores, as bebidas à base de batata-doce também podem oferecer benefícios nutricionais. O tubérculo é rico em vitaminas, minerais e antioxidantes, o que pode conferir propriedades funcionais às bebidas, como melhorar a saúde cardiovascular, fortalecer o sistema imunológico e promover a saúde digestiva.
O mercado de bebidas está em franco crescimento e concentra-se na produção de lácteos e sucos. No segmento alcoólico, as raízes têm sido utilizadas para a produção de destilados e cervejas artesanais, um mercado em franca expansão e que deve ser melhor explorado.
Indústria farmacêutica e cosmética
A batata-doce contém uma variedade de compostos bioativos, como antioxidantes, carotenoides, vitaminas e minerais, que têm sido associados a uma série de benefícios para a saúde.
Esses compostos podem ser extraídos e utilizados como ingredientes ativos em medicamentos e suplementos nutricionais destinados a promover a saúde cardiovascular, fortalecer o sistema imunológico e melhorar a saúde da pele, entre outros.
Desta forma, a batata-doce apresenta elevado potencial para cuidados com a pele devido aos seus antioxidantes e vitaminas, como em cremes, máscaras faciais e loções corporais.
Suplementos alimentares
A batata-doce é um dos principais alimentos indicados para o consumo de quem pratica exercícios físicos. Na formulação de suplementos nutricionais, especialmente para atender demandas específicas, como suplementos pré e pós-treino, este é um mercado muito promissor.
Diversidade de usos da batata-doce
- Alimento saudável e recomendado em dietas
- Na indústria de alimentos (produção de doces, purês, snacks, chips, pães, bebidas lácteas, farinhas, fécula, etc)
- Na indústria farmacêutica (medicamentos e suplementos nutricionais)
- Na indústria de cosmética (cremes, máscaras faciais e loções corporais)
- Produção de ramas para alimentação de animais
- Produção de etanol
- Produção de destilados e cervejas artesanais
- Produção de bioplásticos
“O uso das folhas da batata-doce para saladas é um mercado promissor”