Publicidade

Lúpulo: cultivo ganha expressão no Brasil

Nos últimos anos, o cultivo de lúpulo no Brasil apresentou crescimento expressivo, impulsionado por uma combinação de fatores mercadológicos, tecnológicos e institucionais. O principal catalisador desse avanço foi a expansão do mercado de cervejas artesanais e especiais.

Publicado em 1 de setembro de 2025 às 15h14

Última atualização em 3 de setembro de 2025 às 09h30

Acompanhe tudo sobre Lúpulo e muito mais!
Ernane Miranda / Reprodução

Ernane Miranda Lemes
Engenheiro agrônomo, consultor e produtor
ernanefito@gmail.com

O Brasil ainda ocupa uma posição inicial no cenário mundial da produção de lúpulo. As maiores produtividades globais concentram-se nos Estados Unidos, com aproximadamente 53.000 toneladas por ano, seguidos pela Alemanha (48.000 t), China (8.000 t) e República Tcheca (7.900 t).

Ao todo, a Europa produz cerca de 60.000 toneladas anuais, destacando-se Hallertau (Alemanha) e Saaz (República Tcheca), reconhecidas pela qualidade de suas variedades nobres de lúpulo.

A área plantada com lúpulo no Brasil, que era de aproximadamente 25 hectares em 2019, pode chegar, em 2025, a mais 100 hectares plantados – projeção fundamentada no ritmo de crescimento observado nos últimos anos e em estimativas do setor.

Esse crescimento reflete uma taxa média anual de expansão próxima a 30% nos últimos cinco anos, impulsionada por investimentos em pesquisa e na adaptação de variedades ao clima nacional.

Mesmo ainda modesta, a expansão brasileira é promissora com a produção nacional triplicando recentemente, atingindo cerca de 88 toneladas de lúpulo processado entre 2022 e 2023. Ainda assim, o volume brasileiro permanece baixo em comparação aos milhares de hectares cultivados no Hemisfério Norte.

Fotos: Depositphotos

Lá fora

No mercado internacional, o lúpulo é valorizado por sua escassez e pela alta demanda de cervejarias por variedades aromáticas exclusivas, o que tende a valorizar os lúpulos exclusivos, produzidos em locais e condições únicos.

Nichos como lúpulo orgânico e fresco (wet hop) apresentam alto valor agregado e podem ser explorados por produtores brasileiros, que contam com condições climáticas pontuais e favoráveis.

Além disso, o Brasil já começa a produzir lúpulos com perfis sensoriais diferenciados – algumas variedades exibem notas tropicais e cítricas, adaptadas ao clima nacional – o que representa uma característica única e potencialmente valorizada no mercado de cervejas artesanais.

O crescente interesse por cervejas de baixo teor alcoólico e novos estilos sazonais, saborizados, sustentáveis ou híbridos (como IPAs misturadas) reforçam a demanda por ingredientes especiais e de origem certificada, incentivando parcerias entre produtores rurais e cervejarias especializadas.

Fora do universo cervejeiro, o lúpulo também possui aplicações relevantes nos setores medicinal e cosmético, conforme demonstrado por estudos recentes que detalham muitos compostos bioativos presentes no lúpulo.

Características únicas

Há mais de dois milênios se conhecem suas propriedades terapêuticas. Extratos de lúpulo são utilizados em chás calmantes, suplementos naturais e cosméticos, como máscaras faciais e xampus, devido aos seus efeitos fitoquímicos.

Essa versatilidade multiplica as oportunidades comerciais, permitindo que parte da renda dos produtores venha da venda de matéria-prima para indústrias farmacêuticas e de cosméticos de alto padrão.

O governo brasileiro reconhece que incentivar a produção nacional de lúpulo contribui para abastecer esses setores com insumo nacional acessível e de qualidade (agrolink.com.br).

Panorama interno

No panorama cervejeiro, o Brasil é o terceiro maior produtor de cerveja do mundo, com aproximadamente 15 bilhões de litros anuais – um volume que garante demanda interna sólida e contínua.

O setor emprega mais de 130.000 pessoas, entre empregos diretos e indiretos. À medida que a lupulicultura avança, ela se integra a esse mercado multimilionário. Alcançar a autossuficiência ou iniciar exportações de lúpulo pode representar um impulso significativo para a economia agrícola.

Embora o cultivo de lúpulo no Brasil ainda esteja em fase emergente, e repleto de desafios, o seu crescimento é sustentado por resultados consistentes e competitivos. Os desafios climáticos e tecnológicos são consideráveis, mas iniciativas institucionais e individuais já demonstram que o país tem potencial para tornar-se referência em lupulicultura tropical.

Com os mercados cervejeiro, farmacêutico e cosmético em expansão, os produtores brasileiros, sempre aliados a consultorias técnicas especializadas, encontram uma oportunidade estratégica para agregar valor à agricultura local, diversificar a economia rural e conectar o campo a cadeias industriais complexas e inovadoras.

Demanda crescente

Desde 2010, a demanda por bebidas com maior valor agregado e perfis sensoriais diferenciados vem crescendo de forma contínua. Em 2018, havia 889 cervejarias registradas no país; esse número saltou para 1.209 em 2019 e chegou a 1.847 em 2023, com um crescimento de 6,8% em relação ao ano anterior.

Esse dinamismo do setor cervejeiro fomentou o interesse por fornecedores nacionais de lúpulo (cones florais de lúpulo), até então quase totalmente dependentes da importação.

Avanços

Paralelamente, o investimento em pesquisa e desenvolvimento foi decisivo para viabilizar a produção em condições tropicais. Estudos apontam que variedades como Cascade e Chinook apresentam bom desempenho em regiões brasileiras, com níveis de lupulina comparáveis aos padrões internacionais.

Iniciativas da Embrapa, IICA/MAPA e CETENE/MCTI resultaram na adaptação de mudas por meio da micropropagação, além do uso de iluminação artificial para suplementação do fotoperíodo, especialmente em latitudes mais baixas.

Destacam-se ainda os avanços obtidos com o uso de Azospirillum pela Embrapa, que indicam um aumento superior a 50% na biomassa aérea do lúpulo, além de maior vigor e enraizamento das plantas.

Rentabilidade é o que interessa

O fator econômico também tem grande relevância nesse crescimento do lupulicultura no Brasil. O Brasil importa mais de 4,7 mil toneladas de lúpulo por ano, movimentando mais de R$ 450 milhões.

Cresce o mercado de cervejas artesanais e especiais

Essa balança comercial negativa despertou o interesse por uma produção nacional estruturada. Políticas públicas como a inclusão do lúpulo no programa Moderagro, capacitações e o fortalecimento institucional via instituições como a Aprolúpulo contribuem para consolidar ainda mais essa cultura no país.

Esse avanço recente do lúpulo brasileiro, portanto, resulta da sinergia entre demanda crescente, ciência e desenvolvimento aplicado ao campo e apoio governamental e financeiro – construindo um cenário promissor para a produção nacional.

Regiões em destaque no cultivo

As regiões sul e sudeste concentram a maior parte da produção de lúpulo no Brasil. Santa Catarina, Rio Grande do Sul e São Paulo lideram em área plantada e volume colhido; treze estados já cultivam a cultura em menor escala.

Esses locais são privilegiados por altitudes que podem chegar a 1.400 m, clima ameno e disponibilidade de água de boa qualidade para irrigação.

Na Serra da Mantiqueira (divisa MG-SP), as altitudes e as temperaturas moderadas reproduzem condições semelhantes às de latitudes mais ao sul, favorecendo o desenvolvimento vegetativo e a qualidade dos cones florais.

Em São Paulo, segundo o Censo Agropecuário 2022 do IBGE, há 27 produtores com 24,4 ha cultivados – cerca de 46 mil plantas de lúpulo – e 14,5 t colhidas em 2023.

Santa Catarina supera essas cifras, impulsionada por polos como São Joaquim, que alia altitude média de 1360 m e infraestrutura agroindustrial disponível. Outras fronteiras agrícolas avançam com a ampliação das áreas de cultivo nos estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais e a ampliação das áreas em pesquisa para micropropagação e adaptação ao calor, enquanto que no Alagoas são testadas variedades tolerantes a altas temperaturas.

O Triângulo Mineiro e o Sul de Minas se destacam pelo índice pluviométrico bem distribuído de 1200 mm ao ano, e o Distrito Federal ganha espaço com três safras anuais possíveis graças à estação seca bem definida e ao uso intensivo de irrigação.

Condições para o cultivo

Sem suplementação luminosa, o cultivo busca latitudes próximas a 30° S, onde o fotoperíodo de verão atinge cerca de 14 horas de luz – apenas duas horas a menos que o ideal de 16 horas, compensadas por manejo de variedades de florescimento precoce.

Esses fatores explicam por que sul, sudeste e bolsões pontuais no centro‑oeste e nordeste lideram o cultivo. Contudo, experimentos iniciais confirmam que determinadas variedades adaptam‑se melhor a cada região, abrindo caminho para expansão para diferentes solos, climas e altitudes.

Influência das condições climáticas e do solo

O clima e as características do solo são fatores-chave para determinar tanto a produtividade quanto a qualidade de um lúpulo (cones florais). Originária de regiões temperadas, a planta de lúpulo exige fotoperíodos prolongados (idealmente 15-16 horas de luz diária) e alta disponibilidade de nutrientes para completar seu ciclo reprodutivo.

Nas latitudes brasileiras (aproximadamente 14°-25° S), o dia de verão dura cerca de 14 horas, o que pode antecipar a floração e reduzir o rendimento de cones florais. Para compensar essa limitação, produtores brasileiros utilizam suplementação luminosa noturna, garantindo uma fase vegetativa estendida e uma maior produção de cones florais.

O clima tropical traz ainda desafios como a distribuição irregular de chuvas, com picos de estiagem e de excesso hídrico, além de altas temperaturas e umidade que favorecem doenças fúngicas e oomicetos, especialmente aquelas doenças que não são tradicionais em climas temperados.

Nessas condições, o manejo fitossanitário integrado e a irrigação de precisão são imprescindíveis. A irrigação localizada – majoritariamente por gotejamento – é uma exigência para ambientes tropicais para mitigar a variabilidade hídrica, melhorar o uso da água e reduzir a pressão de doenças foliares, sobretudo em períodos críticos do ciclo vegetativo.

Quanto ao solo, o lúpulo prefere substratos profundos, bem drenados, ricos em matéria orgânica, bem nutridos e com pH entre 6,0 e 6,8. Altos teores de potássio e fósforo, além de micronutrientes como zinco e manganês, são essenciais para o desenvolvimento radicular e a biossíntese de compostos de interesse cervejeiro.

Solo otimizado

As fertilizações potássica e fosfatada em solo com pH 5,5 favoreceram a absorção de potássio pelas plantas de lúpulo em experimento no Sul do Brasil, embora a translocação para a parte aérea seja limitada nos estágios iniciais.

Resultados como esses e novas pesquisas regionalizadas precisam ser investigados para melhor entendimento do manejo nutricional do lúpulo em condições tropicais.

O manejo do solo ainda inclui a correção de sua acidez, adubação (macro e micronutrientes) balanceada – preferencialmente baseada em liberação gradual de nutrientes – e bem posicionada ao longo da safra, além do cultivo de culturas de cobertura adequadas para conservar umidade e promover a ciclagem de nutrientes.

A ocorrência de interações positivas entre nutrientes também tem sido observada em solos tropicais, realçando a importância de equilíbrio entre esses elementos para eficientes produções agrícolas. O uso de microrganismos benéficos também tem o potencial de aumentar a disponibilidade de nutrientes e estimular a resistência a estresses.

A maioria dos locais atualmente cultivados com lúpulo no Brasil possui solos moderadamente férteis e são apenas minimamente fertilizados. Pesquisas já elaboraram zoneamentos agroecológicos para identificar áreas de solo e clima ideais e, de modo geral, os solos brasileiros têm permitido o cultivo do lúpulo.

No entanto, estudos indicam que o manejo do solo (física e química), a cobertura vegetal cultivada e uso de microrganismos benéficos são fundamentais para garantir rendimento e qualidade em cada local específico, assim como estabilizar as qualidades cervejeiras da área de cultivo.

Questão de genética

Apesar das adversidades, as variedades melhores adaptadas aos trópicos têm apresentado bom desempenho fotossintético e produtividade de cones florais após o segundo ano de cultivo.

Esses resultados indicam que variedades mais adaptadas juntamente com um manejo adequado das plantas de lúpulo podem proporcionar níveis de compostos amargos e aromáticos (α-ácidos, β-ácidos e óleos essenciais) comparáveis aos dos lúpulos importados, o que pode assegurar um padrão internacional de qualidade.

Dessa forma, ainda que o fotoperíodo limitado e os extremos climáticos brasileiros exijam cuidados adicionais (p.e.: suplementação luminosa e irrigação controlada), a produção nacional tem demonstrado boa qualidade, com teores de ácidos e compostos aromáticos próximos ao ideal, quando se utilizam as tecnologias e insumos adequados.

Em campo

A resposta de uma planta de lúpulo a campo é, portanto, o resultado da interação entre sua genética (variedade), do manejo agronômico adequadamente aplicado, além das condições físicas, químicas e biológicas do solo, do clima e do tempo em momentos estratégicos durante a safra.

Assim, a definição da(s) melhor(es) variedade(s) para o cultivo em um determinado solo e clima, uma nutrição equilibrada da planta, o manejo preciso da irrigação e o controle do fotoperíodo são fatores que mais contribuem para uma boa safra de lúpulo – tanto em quantidade quanto em qualidade.

Para que todos esses fatores atuem de forma harmoniosa com o intuito de atingir uma produção e qualidade de lúpulo equivalente aos lúpulos importados, é indispensável o acompanhamento técnico por um consultor experiente.

Principais variedades cultivadas no país

A maior parte do lúpulo brasileiro é composta por variedades estrangeiras amplamente utilizadas no mercado mundial. As variedades mais cultivadas no país são Cascade, Chinook, Columbus, Nugget, Saaz, Centennial e Comet.

Exceto pela variedade Saaz, de origem tcheca, as demais são norte-americanas, conhecidas por seu aroma cítrico e elevado teor de alfa-ácidos. Outras variedades com presença significativa são alemãs tradicionais, como Hallertauer Magnum e Hallertauer Mittelfrueh.

Em São Paulo, por exemplo, produtores e viveiristas locais vêm testando uma gama de variedades voltadas tanto ao aroma quanto ao amargor, incluindo Alpha Aroma ou Rakau (uma variedade genérica de alta produtividade), Cascade, Centennial, Chinook, Columbus, Comet, Crystal, Hallertauer Magnum e Hallertauer Mittelfrueh (investe.sp.gov.br).

Dessa forma, o leque de variedades no Brasil inclui principalmente aquelas já consolidadas internacionalmente, utilizadas tanto para amargor (Nugget, Columbus, Magnum, entre outras) quanto para aroma (Cascade, Centennial, Saaz, Crystal, entre outras).

Há ainda esforços nacionais voltados ao desenvolvimento de variedades próprias: um banco de germoplasma foi formado com o objetivo de testar e, eventualmente, melhorar geneticamente variedades mais adaptadas às condições brasileiras.

Impacto da produção nacional

Apesar do volume reduzido de produção de lúpulo no Brasil (menos de 2% da demanda anual), o crescimento da produção interna vem beneficiando a cadeia da cerveja artesanal de várias maneiras.

Tradicionalmente, o setor cervejeiro brasileiro depende quase totalmente da importação de lúpulo, o que eleva os custos e torna as cervejarias vulneráveis a variações cambiais e logísticas.

Com o aumento da oferta nacional, as cervejarias artesanais passam a ter acesso a matéria‑prima local, fresca e de alta qualidade. Isso pode reduzir os custos de importação e encurtar o tempo de abastecimento, além de possibilitar experimentos com perfis aromáticos mais característicos da identidade local (terroir brasileiro) – tanto por notas tropicais distintivas que podem surgir quanto pela maior frescura do lúpulo colhido por produtores regionais.

Além disso, a disponibilidade de lúpulo nacional favorece a cooperação entre produtores rurais e cervejarias. Cervejeiros, principalmente os artesanais, já relatam ter realizado testes com o lúpulo brasileiro em receitas, inclusive em concursos locais.

A Aprolúpulo contribui com essa integração incentivando e participando de eventos e festivais de cerveja como a Copa Nacional do Lúpulo e o Festival Brasileiro de Cerveja. Outro aspecto que adiciona valor à produção é fato de que o lúpulo também ser matéria‑prima para as indústrias farmacêutica e cosmética.

Assim, os ganhos em escala no cultivo aqui no Brasil podem atender simultaneamente às cervejarias e às indústrias correlatas, solidificando a oferta e a demanda.

Autossuficiência brasileira

No médio prazo, à medida que a produção brasileira começa a se expandir, abre‑se a perspectiva de autossuficiência no fornecimento de lúpulo. Há uma expectativa de que, em 20 a 30 anos, o Brasil poderá ser autossustentável em lúpulo, inclusive havendo hoje casos de grandes cervejarias utilizando lúpulo produzido nacionalmente.

Por exemplo, o Grupo Petrópolis começou a produzir lotes de cerveja com lúpulo cultivado em Uberaba (MG). Assim, no cerne da cadeia cervejeira artesanal, a produção local de lúpulo fortalece o setor ao reduzir e diversificar os insumos, estreitar o vínculo entre fazenda e fábrica, e valorizar a imagem de um produto genuinamente brasileiro.

Desafios enfrentados pelos produtores brasileiros

Em primeiro lugar, trata-se de uma cultura relativamente recente e de alto grau tecnológico em um país com pouca tradição e disponibilidade reduzida de técnicos especializados.

Como é ainda incipiente no Brasil, há poucos registros científicos que possam servir de referência para o manejo adequado do lúpulo. Consequentemente, muitos produtores precisam aprender na prática ou testar soluções de manejo, o que gera incertezas quanto à adubação, irrigação, poda, controle de pragas e outros tópicos críticos durante a produção de lúpulo e no processamento pós-colheita.

Essa realidade impõe desafios extras a quem queira cultivar lúpulo no Brasil, incluindo o risco de interrupção da atividade por falta de planejamento e de consultoria em todas as etapas do processo produtivo, tanto em campo quanto no pós-colheita.

Conforme já mencionado, os desafios associados ao cultivo de lúpulo em regiões de clima tropical incluem a necessidade de irrigação e de suplementação de luz devido ao fotoperíodo reduzido, uma maior pressão de doenças decorrente das condições climáticas adversas e a limitada disponibilidade de variedades adaptadas a tais condições.

Tais fatores demandam não apenas investimentos adicionais em infraestrutura, intensificação do manejo fitossanitário e avanços em programas de melhoramento genético voltados à adaptação edafoclimática, mas também a participação de consultoria técnica especializada.

Há também barreiras econômicas e estruturais. Por se tratar de uma cultura agrícola que necessita de tecnologia especializada, o lúpulo exige um elevado investimento inicial – instalação de treliças, sistemas de irrigação, suplementação luminosa, mudas e infraestrutura dedicada ao pós-colheita.

No Brasil, a escala de produção ainda é pequena demais para justificar colheitadeiras de maior capacidade; apesar disso, produtores brasileiros têm importado equipamentos menores – muitas vezes usados – da Europa; algumas soluções nacionais mais completas ainda estão em desenvolvimento.

Isso eleva o custo do quilo de lúpulo processado, tornando a competitividade mais sensível. Até recentemente, o acesso a mudas certificadas também era limitado. Em 2023, existiam apenas 17 viveiros registrados para comercialização de mudas no país, limitando uma expansão acelerada.

Finalmente, os produtores enfrentam desafios no mercado interno, pois embora a demanda esteja crescente, o volume de produção nacional ainda permanece reduzido, totalizando apenas 88 toneladas em 2023, em comparação com as milhares de toneladas importadas.

Para competir, é fundamental que os produtores ofereçam qualidade uniforme e confiável, o que exige continuidade dos plantios e profissionalização da cadeia produtiva, além de investir na expansão das áreas de cultivo e em consultorias especializadas.

Assim, as principais dificuldades são de ordem tecnológica (clima, manejo, pesquisa), econômica (escala, custos iniciais) e organizacional (cadeia pequena e nascente), exigindo visão de longo prazo e ações coordenadas para consolidar o lúpulo como uma cultura robusta no cenário agrícola brasileiro.

Avanços tecnológicos e genéticos

Nos últimos anos, houve notáveis avanços que impulsionam o cultivo de lúpulo no Brasil, especialmente nos âmbitos tecnológico, genético e agronômico. Em produção de lúpulo em campo, destaca-se o uso de suplementação luminosa para estender o período de luminosidade dos dias mais curtos após o solstício de verão e incrementar o rendimento de cones florais.

Vários produtores e centros de pesquisa adotaram sistemas de LED para fornecer duas a seis horas extras de luz noturna – técnica inspirada em países de clima temperado – pois, quando o fotoperíodo atinge cerca de 16 horas, são observados aumentos significativos na produtividade e na qualidade do lúpulo.

Do ponto de vista genético, os avanços incluem a seleção de variedades adaptadas. Embora as variedades de lúpulo ainda sejam importadas, ensaios no Brasil identificaram as variedades que melhor se adaptam sob calor e umidade tropicais.

Como já mencionado, após dois anos de estudo, variedades de lúpulo como Cascade e Chinook produziram perfis de óleos essenciais e ácidos amargos satisfatórios. Outras propostas de melhoramento do lúpulo para condições brasileiras também estão em andamento com a formação de um banco de germoplasma com o objetivo de futuramente obter variedades exclusivas para nossas condições.

Nas inovações agronômicas, o uso de biofertilizantes inoculando as mudas com fungos micorrízicos e bactérias do solo têm apresentado resultados positivos para o vigor radicular e biomassa aérea das plantas.

No pós-colheita, pesquisadores estão definindo protocolos de temperatura e tempo de secagem padronizados para preservar os aromas do lúpulo fresco. Equipamentos de desidratação em menor escala com controle de temperatura também estão sendo desenvolvidos para pequenos agricultores assim como sistemas de peletização e armazenamento para pequenas escalas.

Fortalecimento da economia agrícola local e regional

Inicialmente, deve-se considerar que o lúpulo é um produto de alto valor agregado. Em média, um hectare produtivo pode render cerca de duas toneladas de cones florais peletizados por ano (duas safras).

Dependendo da variedade, dos teores de alfa-ácidos e dos compostos voláteis definidos em análises químicas e no teste cervejeiro, cada quilo de lúpulo adequadamente beneficiado (secagem e peletização com qualidade) pode alcançar valores em torno de R$ 300,00 ou mais, com preços médios de venda situando-se entre R$ 90,00 e R$ 140,00 por quilo.

Até áreas reduzidas apresentam rentabilidade superior à de cereais convencionais, atraindo o interesse de agricultores que buscam diversificar a renda em pequenos lotes ou em terrenos impróprios para outras culturas.

Contudo, qualquer futuro lupulicultor deve ter em mente que além dos custos e desafios da produção do lúpulo a campo, existem ainda os processos de colheita, beneficiamento, armazenamento e comercialização em que cada um apresenta desafios próprios e carecem de suporte técnico para não haver perdas de produção e da qualidade (oxidação de ácidos e degradação de óleos essenciais) do lúpulo produzido a campo.

Além disso, por envolver múltiplas cadeias de valor, os ganhos se disseminam pela região. A produção gera demanda por viveiros, serviços de implantação (p.e.: mudas, estruturas de suporte, irrigação, suplementação luminosa), unidades de beneficiamento (colheita, secagem, empacotamento) e logística de matérias primas e do próprio lúpulo. Isso cria empregos diretos no campo e dinamiza serviços regionais – engenharia agrícola, transporte e manutenção de equipamentos – estimulando o desenvolvimento local.

No que tange à balança comercial agrícola, o lúpulo movimenta hoje centenas de milhões de reais por ano no Brasil, valor quase integralmente direcionado à importação do lúpulo.

Incrementar a produção nacional significa reter esses recursos nos estados produtores uma vez que o dinheiro pago a agricultores locais circula em compras de insumos, pagamento de salários e manutenção de maquinário na própria região.

Dessa forma, o lúpulo contribui para a diversificação do agronegócio e causar o aproveitamento de áreas serranas com baixa aptidão para cereais.

Esse aproveitamento tem o potencial de revitalizar pequenas propriedades, estabilizar a renda familiar e gerar mais empregos rural. E em um horizonte médio (5 a 10 anos), caso o Brasil se torne exportador, haverá aporte direto de divisas externas.

Este cenário propõe uma leitura dinâmica e acessível para técnicos, investidores e produtores, combinando dados numéricos e aspectos práticos, onde cada etapa da cadeia de valor contribui para o fortalecimento regional e a sustentabilidade econômica.

Participe do Nosso Canal no WhatsApp

Receba as principais atualizações e novidades do agronegócio brasileiro.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Pesquisar

Últimas publicações

1

Caraguatá: fruta atrai pelos benefícios medicinais

2

Manga Shelly: a variedade premium que conquista o mercado mundial

3

Tarifaço causa queda de 28% nas exportações da piscicultura brasileira no 3º trimestre

4

Brasil reforça protagonismo na olivicultura em encontro do Conselho Oleícola Internacional

5

Conexão Abisolo 2025 destacou pesquisa, inovação e sustentabilidade

Assine a Revista Campo & Negócios

Tenha acesso a conteúdos exclusivos e de alta qualidade sobre o agronegócio.

Publicações relacionadas

Sintomas de Síndrome da Murcha da Cana

Síndrome da Murcha da Cana é ameaça contínua aos canaviais

Dr. Aldir Alves Teixeira durante palestra sobre cafés de alta qualidade no Concurso de Qualidade dos Cafés de Origem da Região de Pinhal.

Concurso de Qualidade dos Cafés de Pinhal destaca Dr. Aldir Alves Teixeira

Xícara de café descafeinado ao lado de grãos, representando o processo de extração da cafeína.

Café descafeinado: benefícios, diferenças e como é feito

Banner da campanha Arroz Combina mostra pratos variados com arroz brasileiro.

Campanha Arroz Combina valoriza o consumo do arroz brasileiro