



As cooperativas e associações de café certificadas Fairtrade em todo o Brasil já estão se mobilizando para enfrentar os impactos das mudanças climáticas no campo. Ações estruturadas de adaptação, monitoramento e manejo sustentável vêm ganhando força entre agricultores familiares, que buscam tornar suas lavouras mais resilientes diante de secas prolongadas, chuvas irregulares e oscilações de temperatura.
Um estudo da Coordenadora Latino-Americana e do Caribe de Pequenos(as) Produtores(as) e Trabalhadores(as) do Comércio Justo (CLAC) reforça a importância do caminho que já vem sendo construído pelas cooperativas certificadas. Em visita recente ao Brasil, o oficial de Mudanças Climáticas da entidade, Ramiro Marcelo Lizaru Carranza, destacou que os eventos extremos estão se intensificando e exigem iniciativas concretas de adaptação.
O tema será levado pelos representantes da CLAC para a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), que será realizada em Belém (PA) a partir do dia 10, ampliando o debate internacional sobre os desafios e a adaptação na cadeia do café. Ramiro alerta que secas mais longas, ondas de calor intenso, chuvas fora de época e o aumento de pragas e doenças já são realidade em diversas regiões produtoras e representam risco para a qualidade do café e a estabilidade econômica de milhares de famílias rurais.
“Vão haver mudanças grandes na produção agrícola no Brasil. Regiões tendem a ficar mais secas e teremos perda de cultivos”, afirma Ramiro. Segundo ele, embora o excesso de emissão de gases de efeito estufa esteja concentrado em setores industriais e em países mais desenvolvidos, são os pequenos produtores quem mais sentem os efeitos das alterações climáticas. Isso inclui, por exemplo, o aumento dos custos para manter a produção e a necessidade de adotar medidas de adaptação para garantir a sobrevivência dos cultivos.
Ações no campo
No Brasil, 24 associações e cooperativas de café – que agregam mais de 3 mil cafeicultores e cafeicultoras – possuem a certificação Fairtrade, reconhecida internacionalmente por promover relações comerciais mais justas e sustentáveis. No Brasil, a CLAC, em parceria com a Associação das Organizações de Produtores Fairtrade do Brasil (BRFAIR) e as cooperativas e associações, já promove diversas iniciativas em apoio aos produtores.
Entre elas está o Plano de Adaptação às Mudanças Climáticas (PDA), instrumento estratégico que define ações, metodologias e atividades voltadas a fortalecer a resiliência climática das propriedades certificadas Fairtrade.
O plano, que será levado como exemplo para a COP30, considera fatores sociais, culturais, econômicos, organizacionais e ambientais de cada território, orientando o desenvolvimento de práticas sustentáveis no campo. Essas ações já têm apresentado resultados positivos nas lavouras, contribuindo para maior estabilidade produtiva, redução de impactos ambientais e fortalecimento da cafeicultura de base familiar.
“A CLAC considera que os meios de produção associativos de pequenos produtores são soluções viáveis para enfrentar os efeitos das mudanças climáticas, por isso está apoiando, em um primeiro momento, a elaboração de planos de adaptações adequados à realidade dos pequenos produtores e suas organizações. Posteriormente serão feitas as implementações desses planos de adaptações através de apoio técnico”, destacou Ramiro.
Experiências concretas reforçam o potencial dessas ações. A engenheira agrônoma e diretora regional para o Cone Sul da CLAC, Catalina Jaramillo,destaca resultados positivos obtidos por organizações certificadas Fairtrade, que implementaram manejo sustentável, reflorestamento, proteção de nascentes e monitoramento climático – medidas que reduziram perdas e aumentaram a qualidade dos cafés.
“Quando você visita as propriedades, você consegue ver que lavouras tratadas com todas essas práticas agrícolas e com toda essa orientação, com esses cuidados ambientais, produzem mais. Elas estão em melhores condições para enfrentar uma seca pronunciada ou chuvas fortes, porque faz parte de um bom manejo da lavoura”, informou.
A gestora de fortalecimento da CLAC, Gisele Sampaio Marcílio, reforça a fala de Catalina, citando como as ações voltadas ao campo dão resultados. “Um produtor nos contou que dobrou sua produtividade, não só com a implementação destas práticas que estão no plano de adaptação, mas com todo o manejo que vem sendo trabalhado através dessa certificação Fairtrade. A gente consegue observar no campo a diferença da estrutura das plantas entre um plantio certificado e o outro convencional. A estrutura das plantas, a cor e o vigor as tornam mais resistentes períodos de secas”, afirmou.
Mais de 200 mil cafeicultores terão voz na COP30
Com a missão de ampliar a visibilidade da agricultura familiar em espaços decisórios, a CLAC participará da COP30 levando a voz de mais de 200 mil cafeicultores de 10 países da América Latina e Caribe. Os responsáveis para esse trabalho serão Catalina e Carlos Renato Alvarenga Theodoro, que é presidente da Cooperativa dos Cafeicultores do Sul do Estado do Espírito Santo (Cafesul), que fica no município de Muqui.
Eles atuarão em debates com governos, instituições e setores produtivos, reforçando o protagonismo dos pequenos agricultores na mitigação das mudanças climáticas. Renato e Catalina levarão à COP30 o Manifesto CLAC, documento que reúne demandas e propostas de adaptação, proteção ambiental e fortalecimento da agricultura de base comunitária. A participação do grupo na conferência simboliza o compromisso em defender políticas públicas que assegurem condições de produção sustentáveis e maior reconhecimento ao papel dos pequenos produtores na preservação dos ecossistemas.
