O setor de aparas de papel e papelão registrou 59,7% no volume total de reciclados em 2024, pior índice desde 2028. É o que demonstram os números do mais recente relatório do setor, realizado pela Associação Nacional dos Aparistas de Papel (ANAP), elaborado pela MaxiQuim e apresentado durante a Eco Expo 2025, maior evento da América Latina sobre gestão de resíduos sólidos, reciclagem e sustentabilidade, apresentado nesta quinta-feira (23).
Diante desse cenário, a ANAP ressalta a importância de políticas públicas que garantam a sustentabilidade da cadeia de reciclagem no longo prazo, como a recente publicação do decreto do plástico. “Reforçamos a importância de um decreto para o papel e papelão, que obrigue o uso de conteúdo reciclado nas embalagens e que, ao mesmo tempo, obrigue as empresas a realizarem projetos de logística reversa que remunerem melhor a cadeia de coleta e a tornam, em parte, imune a alterações de preço de commodity”, defende João Paulo Sanfins, vice-presidente da ANAP.
Segundo Sanfins, apesar do aumento de preços e do crescimento no volume, o relatório traz um dado alarmante: o setor não foi rentável em 2024, mesmo crescendo 3% no volume de geração, totalizando 4,65 milhões de toneladas, e um faturamento de R$ 4,2 bilhões, representando um aumento de 30% em relação ao ano anterior. “Esse é um número enganoso. Um aumento de preço tão relevante não ser capaz de reestruturar uma cadeia que foi desfeita por um preço tão baixo é um sinal de alerta. Não podemos ter uma alteração na nossa infraestrutura nacional de coleta em razão de aumento de preços de commodities, que vão oscilar ao longo do tempo”, afirma.
O levantamento aponta também que, para movimentar esse aumento de apenas 3% no volume, foi necessário um acréscimo de 3,5% na mão de obra do setor de aparistas, além de investimentos em renovação de frota e aquisição de empilhadeiras, em razão da necessidade de reestruturação de uma cadeia que foi profundamente afetada pelos preços extremamente baixos praticados em 2023.
Mudança no padrão de fornecimento expõe fragilidade da cadeia
Um dos dados mais reveladores do relatório está na mudança do padrão de fornecimento de aparas de papel. A participação de estabelecimentos comerciais no fornecimento aumentou 10%, enquanto a participação de sucateiros e ferros-velhos caiu 7% e a de cooperativas recuou 3%. Essa alteração significa que os aparistas precisaram assumir diretamente a coleta em estabelecimentos comerciais, substituindo a função que antes era desempenhada pelos pequenos coletores e cooperativas.
“O aumento de preço, por mais significativo que tenha sido, não foi capaz sozinho de reestruturar uma cadeia que foi desfeita pelo choque de preços baixos de 2023. O pequeno coletor, o sucateiro e as cooperativas simplesmente não se mobilizaram novamente para voltar a trabalhar com papel. Para as cooperativas, por exemplo, valeu mais a pena comercializar plásticos nesse momento do que triar papel do resíduo”, explica Sanfins.
Essa desestruturação forçou os aparistas a investirem em mão de obra adicional, renovação de frota e infraestrutura, mesmo tendo capacidade ociosa de máquinas. “O faturamento aumentou, mas esse dinheiro foi imediatamente revertido em investimentos para reestruturar uma cadeia que se tornou deficitária. Isso mostra como é caro e difícil reconquistar uma base de fornecimento que foi perdida”, acrescenta Sanfins.
O relatório também aponta para um cenário de alerta na balança comercial. Em 2024, as importações de aparas de papel cresceram 47%, enquanto as exportações registraram uma queda de 7,5%. Essa inversão no fluxo comercial, que se mantém negativa desde 2020, pressiona os preços no mercado doméstico e gera preocupação para a indústria nacional. Outro ponto de atenção foi a desvalorização de 20,5% no preço das aparas brancas tipo III, impactada pela redução na demanda e pelo aumento no custo da celulose.

